quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Nomes, Números e Pessoas

Quando me recordo do início da minha carreira, lembro de um acontecimento muito marcante.

Eu estagiava com eventos governamentais em um sindicato na cidade de São Paulo, na Rua Pamplona, travessa da Avenida Paulista. Durante aproximadamente um mês, o tempo que durava o curso de oratória do Prof° Oswaldo Melantonio, conheci um aluno chamado Rafael, muito educado, alinhado, e com uma postura invejável a qualquer lorde inglês.

Já que durante a matrícula comentamos que ele fazia o caminho por perto da minha casa ao sair do curso, sempre me dava caronas no seu carrão ao final da noite, quando terminavam suas aulas e também o meu expediente.

O professor Melantonio, grande mestre, sempre muito amável, chamava-o de Rafa e mesmo com todo o respeito que tínhamos por aquele homem, passamos a chamá-lo assim. Inclusive eu, que acabei criando certa amizade durante tantas viagens.

Certo dia quando saíamos do sindicato ele fez uma brincadeira comigo (elas eram muito raras!) e perguntou se eu tinha namorada. Expliquei que estava no primeiro ano da faculdade, “curtindo” o tempo de estudante sem relacionamentos sérios e aproveitando o tempo que teria morando sozinho em São Paulo.

Ele ficou mudo até quase chegarmos à porta da minha casa, sem dar indícios de qualquer julgamento sobre minha resposta, dirigindo tranquilamente pelas ruas.

Aproveitei a brecha e toda a curiosidade latente de moleque sobre aquele amigo tão reservado e perguntei se era casado.

Sua resposta me marcou de maneira talvez um pouco assustadora, talvez um pouco surpreendente, mas certamente inesperada.

Lembro que aquele homem sério e muito calado ficou com os olhos molhados ao responder:

“Conheci a mulher da minha vida quando tinha 24 anos. Depois, quando fiz 30 anos, consegui perdê-la e nunca mais a conquistei novamente. Tentei me relacionar muitas outras vezes, mas era ela, sabe? Ela nunca mais voltou..."

Não só passamos o resto da viagem em silêncio como aquele homem, o Rafa, o senhor Rafael a partir daquele dia, não comentou mais sobre caronas até o final do curso.

Aquelas palavras, ditas para um garoto ainda leviano de pouco mais de 18 anos que acabara de ingressar na faculdade e iniciara finalmente sua vida de relacionamentos profissionais e, de certo modo, também os pessoais, acabaram por bater na minha cabeça como um sino de catedral.

De tempos em tempos, a cada nova escolha que faço e que envolve pessoas, penso um pouco no Rafa.

Naquele homem sério, de terno preto, alhos azuis profundos e graves que acredita numa pessoa certa, e apenas numa pessoa, para a sua vida. Penso que aquela mulher foi para ele como Beethoven para a música, Leonardo da Vinci ou Picasso para as artes ou Albert Einstein para as ciências. Alguém insubstituível e inimaginavelmente necessária e inspiradora, capaz de quebrar essa crença que temos hoje de que todo mundo é substituível. Ele tinha lá seus 50 anos e não encontrara ninguém para substituir aquele amor.

Então comecei a pensar na matrícula da faculdade (então 204100), no meu RG, nos crachás das empresas em que trabalhei contendo apenas números e cargos, nos funcionários que eram revistados na saída das fábricas de medicamentos e nas pessoas que cruzaram comigo por todos esses caminhos. Pessoas que, muitas vezes, foram também números em série, analistas, estagiários, alunos numa lista de escola, doentes nas filas de hospitais, gênios e burros retratados por notas de zero a dez.

Todas elas pessoas sim, mas avaliadas em notas de zero a dez. Vez por outra trocadas, marginalizadas, "trucadas" e jogadas para escanteio.

Noutras vezes, porém, foram pessoas por mim subestimadas ou até insubstituíveis. Por mim, por si mesmas e por todos.

E na última semana recebi o texto abaixo num e-mail enviado pela minha tia. Novamente me perguntei:

E você, é insubstituível?

Na sala de reunião de uma multinacional o diretor nervoso fala com sua equipe de gestores. Agita as mãos, mostra gráficos e, olhando nos olhos de cada um, ameaça: “ninguém é insubstituível".

A frase parece ecoar nas paredes da sala de reunião em meio ao silêncio.

Os gestores se entreolham, alguns abaixam a cabeça. Ninguém ousa falar nada. De repente um braço se levanta e o diretor se prepara para triturar o atrevido:

- Alguma pergunta?
- Tenho sim. E Beethoven?
- Como? - encara o gestor confuso.
- O senhor disse que ninguém é insubstituível e quem substituiu Beethoven?

Silêncio.

O funcionário então diz:
- Ouvi essa estória esses dias, contada por um profissional que conheço, e achei muito pertinente falar sobre isso.
Afinal as empresas falam em descobrir talentos, reter talentos, mas, no fundo, continuam achando que os profissionais são peças dentro da organização e que, quando sai um, é só encontrar outro para por no lugar.

Quem substituiu Beethoven? Tom Jobim? Ayrton Senna? Ghandi? Frank Sinatra? Garrincha? Santos Dumont? Monteiro Lobato? Elvis Presley? Os Beatles? Jorge Amado? Pelé? Paul Newman? Tiger Woods? Albert Einstein? Picasso? Zico?

Todos esses talentos marcaram a história fazendo o que gostam e o que sabem fazer bem, ou seja, fizeram seu talento brilhar. E, portanto, são sim insubstituíveis.

Cada ser humano tem sua contribuição a dar e seu talento direcionado para alguma coisa. Está na hora dos líderes das organizações reverem seus conceitos e começarem a pensar em como desenvolver o talento da sua equipe focando no brilho de seus pontos fortes e não utilizando energia em reparar seus 'gaps'.

Ninguém lembra e nem quer saber se Beethoven era surdo, se Picasso era instável, Caymmi preguiçoso, Kennedy egocêntrico, Elvis paranóico... O que queremos é sentir o prazer produzido pelas sinfonias, obras de arte, discursos memoráveis e melodias inesquecíveis, resultado de seus talentos.

Cabe aos líderes de sua organização mudar o olhar sobre a equipe e voltar seus esforços em descobrir os pontos fortes de cada membro. Fazer brilhar o talento de cada um em prol do sucesso de seu projeto.

Se seu gerente/coordenador, ainda está focado em 'melhorar as fraquezas' da sua equipe corre o risco de ser aquele tipo de líder que barraria Garrincha por ter as pernas tortas, Albert Einstein por ter notas baixas na escola, Beethoven por ser surdo. E na gestão dele o mundo teria perdido todos esses talentos.

Nunca me esqueço de quando o Zacarias dos Trapalhões 'foi pra outras moradas'. Ao iniciar o programa seguinte, o Dedé entrou em cena e falou mais ou menos assim:

"Estamos todos muito tristes com a 'partida' de nosso irmão Zacarias... e hoje, para substituí-lo, chamamos: Ninguém... pois nosso Zaca é insubstituível"

Portanto nunca esqueça: Você é um talento único. Com toda certeza ninguém o substituirá.

"Sou um só, mas ainda assim sou um. Não posso fazer tudo, mas posso fazer alguma coisa. Por não poder fazer tudo, não me recusarei a fazer o pouco que posso".

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segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Elogio

Todos sabemos que existem inúmeros fatores positivos em dar um bom elogio.
Elogiar não é apenas um ato de bondade ou boa vizinhança, um elogio pode ser estratégico, premeditado, pode derrubar barreiras num relacionamento e até criar um vínculo de amizade em relacionamentos aparentemente ermos.

A etimologia diz que a palavra “elogio” vem da junção de duas palavras gregas que significam “bom” ou “bem” mais “fala”, “palavra” ou “frase”. Na tradução literal significa “falar bem”.

Então se elogiar é falar bem sabemos que nem todas as pessoas se consideram aptas a fazê-lo corretamente e, na dúvida, muitas deixam de fazê-lo por este motivo.

Assim como um medicamento o elogio precisa ser dosado e corretamente escolhido para cada caso. Um medicamento certeiro pode erradicar um mal ou preveni-lo, tornando a pessoa mais forte e completamente saudável ou, de outra forma, uma prescrição baseada num diagnóstico errado pode causar efeitos colaterais, não erradicar uma doença e ainda deixar que ela se espalhe.

Mas, cá entre nós, no caso de uma doença eminente e na falta de um médico você deixaria de cuidar de alguém?
E se essa doença nascer em um relacionamento onde, por falta de conhecimento, alguém deixar de medicar só por que não se sente seguro o suficiente para fazê-lo ou simplesmente não se importa ou esquece-se de prevenir?

Isso tudo é medo de errar. Medo de distribuir elogios como analgésicos e ser taxado de fraco ou puxa saco. Aí as pessoas decidem usar elogios como antibióticos e, por vezes, acabam por parecerem descompromissadas ou, pior ainda, quando trocam elogios por críticas e são dadas como invejosas.

Com elogios certeiros muitos se tornam grandes líderes e, sem eles, a grande maioria das pessoas nem mesmo é ouvida.

Os elogios independem de palavras, não são apenas frases de agrado. Quem nunca escutou um elogioso “parabéns” nas lágrimas de uma mãe orgulhosa ou no aperto de mão de um chefe?

Um elogio construtivo, do tipo que damos em público a uma criança que fez um bom esforço ou ajudou outra pessoa sem interesse próprio será, sem dúvida, um ponto importante na formação do caráter de um indivíduo.

Afirmar que alguém está certo ou dar o devido valor à inteligência alheia não apenas enaltece uma boa característica desta pessoa, mas também comprova a perspicácia, o senso de justiça e a sabedoria de quem elogia.

Aquele grito – YES! – e o soco no ar que damos a cada conquista pessoal é o elogio mais sincero que você pode fazer à pessoa que mais precisa amar nesse mundo, pode acreditar em mim quando afirmo isso.

Existe ainda o elogio que traz sentimento, ou seja, aqueles parabéns sinceros para alguém que realmente amamos e que também significa “amo estar com você nesses bons momentos”, aquele abraço que damos num amigo que perdeu os pais ou a última homenagem que fazemos a alguém e que significa “você é importante para mim e por isso estou aqui agora”.

Todos esses são momentos que merecem, necessitam de um elogio. Cada segundo de conquistas ou derrotas se encaixa numa série de gestos, atos e palavras que podem reforçar positivamente uma alegria tanto quanto cicatrizar rapidamente uma ferida.

Como não há um mapa que explique onde encontrar os elogios corretos para cada ocasião, tampouco um termômetro que possamos usar para medir a temperatura correta dos nossos elogios e, sendo verdade que todos necessitamos deles – Eu, pelo menos, confesso que necessito – para sabermos o valor das nossas decisões e reforçar a tão volátil autoconfiança, elogiar torna-se uma característica de poucos, mas que possui um valor importantíssimo para quem quer ser mais do que a média.

Por isso acredito que o trabalho de aprender a conduzir elogios e espalhá-los na dose correta entre todas as pessoas que amamos pode ser muito frutífero, para não dizer imprescindível.

Então vá! Tente, arrisque, elogie e faça novamente.
Por que, mesmo que erre, tenho certeza de que você também consegue e, pode ter certeza, todos precisam disso.

Eilor Marigo
http://twitter.com/EilorMarigo
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